terça-feira, 28 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XVII

Cenário: Gabinete do novo Secretário Municipal de Finanças. Personagens: o novo Secretário e o Diretor de Fiscalização.
Sobe o pano.
Secretário – Eu chamei você aqui para nos conhecermos melhor e passar os meus planos para aumentar a receita.
Diretor – O senhor sabe que já coloquei o meu cargo à disposição, para o senhor ficar à vontade no caso de querer me substituir. Por mim, não será problema deixar o cargo, porque sou Auditor Fiscal de carreira e volto à minha função.
Secretário – De jeito nenhum! Não pretendo tirar ninguém, mas você terá de provar que está apto ao cargo.
Diretor – Com oito anos na função, acho que não preciso provar mais nada.
Secretário – Olha, eu venho da iniciativa privada, onde trabalhei quase quarenta anos. Nunca trabalhei em serviço público e posso lhe dizer que não gostei de nada do pouco que já vi aqui.
Diretor – Pode me dar alguns exemplos?
Secretário – Na sua área, por exemplo, o que é aquela sala onde entra um monte de contadores e fica cochichando com os Fiscais?
Diretor – O senhor está se referindo ao plantão fiscal?
Secretário – Pois é! Não gosto daquela intimidade de conversinha particular!
Diretor – Mas são assuntos sigilosos e não podem ficar falando alto.
Secretário – E você mesmo confessa que são assuntos sigilosos! Um grande indício de corrupção!
Diretor – Corrupção? Não estou entendendo...
Secretário – Meu caro, eu não nasci ontem! Vamos falar claro! E aquele sofá que você tem na sua sala? Para que serve?
Diretor – Ora, para atender as pessoas.
Secretário – Muita intimidade! Muita intimidade! Trate de trocar aquele sofá por duas cadeiras. Desde que vi aquele sofá, não gostei dele.
Diretor – Se o problema é o sofá, eu troco por duas cadeiras.
Secretário – Ótimo! Esse assunto está resolvido. E quanto aos Fiscais, acabe com aquela sala e mande todo mundo pra rua, pra fiscalizar. O dinheiro está lá fora e não aqui dentro.
Diretor – E quem vai atender os contribuintes?
Secretário – É pra isso que temos a central de atendimentos!
Diretor – Está bom, não vou discutir, acabo com o plantão fiscal.
Secretário – Pois é isso que eu quero. Outra coisa, eu vi a lista de serviços do ISS e está faltando muita coisa. Acho muito suspeito não constar, por exemplo, os bares e restaurantes. Essa cidade está cheia de bares e restaurantes!
Diretor – Bar e restaurante pra pagar o ISS?
Secretário – Exatamente! A partir de agora acabaram-se os privilégios!
Diretor – Secretário, bar e restaurante não pagam ISS...
Secretário – Pois acabou essa pouca vergonha! Todo mundo tem que pagar!
Diretor – Tem que fazer lei...
Secretário – De jeito nenhum! Eu faço uma portaria e incluo um novo item, mais ou menos assim: e todos os demais serviços não previstos anteriormente. Pronto!
Diretor – Cláusula bonde é proibida...
Secretário – Que bonde? Há quanto tempo não temos bonde na cidade! Bota metrô que algum dia ainda vamos ter.
Diretor – Cláusula metrô... Esta é boa...
Secretário – Você por acaso está ironizando? Pois saiba que agora a lei vai ser dura, dura lex sed lex...
Diretor - ... E no cabelo só gumex.
Secretário – Já vi que não vai dar pra trabalhar com você. Pode deixar o cargo que vou trazer um amigo, aposentado como eu, que também nunca trabalhou em serviço público, não tem esses vícios como você tem. Aqui está precisando de sangue novo, de mentes arejadas!
Desce o pano.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XVI

Cenário: plantão fiscal de uma Prefeitura. Personagens: Fiscal e Cidadão.
Sobe o pano.
Cidadão – Bom dia. Eu acabei de receber o Alvará da minha oficina e gostaria de obter algumas informações.
Fiscal – Pois não, estou à disposição.
Cidadão – Eu sou Marceneiro e abri uma oficina de marcenaria, mas não sou pessoa jurídica, sou pessoa física, tem algum problema?
Fiscal – Não senhor. O senhor pode trabalhar como profissional autônomo.
Cidadão – Certo. E neste caso, quanto pago de ISS?
Fiscal – Como profissional autônomo de nível médio de ensino, o senhor vai pagar R$ 50,00 ao ano, de acordo com a nossa lei.
Cidadão – Este valor é igual em todo o país?
Fiscal – Não, cada Município tem a sua própria lei. Os valores mudam.
Cidadão – Outra coisa, eu posso emitir nota fiscal?
Fiscal – Pode sim. A nossa legislação permite aos autônomos a emissão de nota fiscal avulsa. Quando o senhor precisar de nota fiscal basta vir aqui e solicitar. O senhor informa os dados do tomador do serviço, o tipo do serviço e o valor. A nota vai sair com o seu nome, sua profissão e o seu CPF.
Cidadão – E quando eu pedir nota fiscal, terei de pagar o ISS dela?
Fiscal – Não, porque o senhor já está pagando o imposto como autônomo. Não posso cobrar duas vezes. E também não há cobrança de taxa. Em nosso Município, este serviço de nota fiscal avulsa é gratuito.
Cidadão – Legal... Eu estava preocupado em perder alguns negócios porque tem gente que exige nota fiscal.
Fiscal – Exatamente. Mas o senhor não vai perder não.
Cidadão – Me disseram que eu devia abrir uma firma de Microempreendedor... Esse tal de MEI... O senhor acha que eu teria vantagem se fosse MEI?
Fiscal – Bem... O senhor sendo MEI a sua atividade profissional não será mais informal... O senhor terá CNPJ...
Cidadão – Desculpe, não entendi... Eu sendo profissional autônomo registrado na Prefeitura, mesmo assim eu sou considerado informal?
Fiscal – Bem... Perante a Prefeitura o senhor não é considerado informal.
Cidadão – Então, perante a quem eu sou informal?
Fiscal – Bom... Eu acho que perante a Receita Federal...
Cidadão – Mas, por quê? Eu declaro o meu imposto de renda como pessoa física.
Fiscal – E o INSS?
Cidadão – Ora, eu já pago o INSS todo mês. Eu calculo 11% do salário de contribuição, o que dá R$65,95.
Fiscal – O senhor sendo microempreendedor prestador de serviço vai pagar somente 5% do salário de contribuição.
Cidadão (fazendo conta) – Então... Eu pagaria R$32,25 de INSS.
Fiscal – Isso! Ia economizar uns R$30,00 por mês.
Cidadão – Interessante... O que mais eu teria de pagar?
Fiscal – Bem, o senhor faz móvel também ou só conserta?
Cidadão – De vez em quando me encomendam pra fazer uma mesa, uma cadeira...
Fiscal – Então o senhor teria de pagar o ICMS também. Mas é baratinho, um real por mês.
Cidadão – E o ISS?
Fiscal – O senhor pagaria R$5,00 por mês.
Cidadão (fazendo conta) – Já seriam R$72,00 ao ano somando o ICMS, ou R$22,00 a mais do que o ISS de autônomo... E o custo do registro da firma?
Fiscal – É de graça e o Contador não pode cobrar, mas, depois de iniciada a atividade, o senhor terá que fazer uma declaração mensal de receita, coisa simples mas não sei se o Contador vai fazer de graça... Tem que juntar as notas de compra e as notas que o senhor emitir.
Cidadão – Talvez o Contador me cobre uns R$50,00 pra fazer isso...
Fiscal – Não sei informar, mas o Contador também precisa ganhar a vida, não é mesmo?
Cidadão – Se for assim lá se foi a diferença do INSS...
Fiscal – Bem, pelo menos o senhor ganha um CNPJ...
Cidadão – Pra que serve o CNPJ?
Fiscal – Ora, o senhor fica cadastrado na Receita Federal... Ela poderá controlar melhor os seus negócios... O senhor poderá abrir conta bancária em nome da firma...
Cidadão – Olha, pensando bem, acho melhor deixar como está.
Desce o pano.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XV

Roteiro: No Município de Arrependidos, o quadro fiscal é um só, ou seja, é constituído de “Fiscal Faz Tudo”, que fiscaliza tributos, posturas, obras, ocupação da área pública e, ainda, ajuda na vigilância sanitária e no meio ambiente. Diante de tamanha capacidade técnica e acadêmica, a categoria é agraciada com um salário substancial: 1,5 Salário Mínimo, mais R$50,00 de ajuda de custo. Cenário: Gabinete do Prefeito. Personagens: Prefeito e Secretário de Finanças.
Sobe o pano.
Prefeito – Tenho recebido muitas reclamações contra os Fiscais. A coisa está ficando intolerável!
Secretário – Alguma denúncia de corrupção?
Prefeito – Antes fosse! Antes fosse! Se fosse, eu demitiria o cara e resolveria o assunto!
Secretário – Então, a reclamação é sobre o quê?
Prefeito – Ora, chateação! Muita chateação! Eles ficam fiscalizando os nossos empresários, ficam xeretando tudo, querem saber de tudo, ora, ninguém agüenta uma aporrinhação dessas!
Secretário – Mas, Prefeito, eles estão exercendo a função deles.
Prefeito – A função deles é pegar camelô, fechar birosca, vigiar as nossas ruas, e não ir atrás dos nossos empresários, que emprega a nossa gente, dá trabalho aos que querem trabalhar, que já são poucos, você sabe, já são poucos!
Secretário – Mas eles precisam fiscalizar, pegar os sonegadores...
Prefeito – Sonegadores? Há – há – há, desculpe lhe dizer, mas você é ainda um ingênuo na política! Entenda isso, meu rapaz, todo mundo sonega! Todo mundo! E mesmo com a sonegação, são eles, os empresários, que ainda botam um dinheirinho nos cofres públicos.
Secretário – Mas o valor que eles pagam é ridículo, o senhor sabe.
Prefeito – Sei sim! E pra mim está muito bom! Dinheiro bom é esse que vem do Governo Federal, do Estadual, essas verbas que arrumo em Brasília. É dinheiro que não me chateia, não me incomoda, não me desgasta politicamente.
Secretário – O senhor sabe que somos obrigados a arrecadar os nossos tributos. O Tribunal de Contas...
Prefeito – Não me fale em Tribunal de Contas!! Essa garotada metida a besta, vem pra cá, examina tudo, pergunta tudo. Já reclamei com o Deputado!
Secretário – O Deputado não pode fazer nada.
Prefeito – Você é que pensa! O Deputado tem muita força.
Secretário – Está certo, Prefeito, embora a força dele tenha um limite.
Prefeito – Bem, isso é problema dele. O que interessa é que você tem que dar um chega pra lá na fiscalização. Manda parar com todas essas fiscalizações!
Secretário – E eles vão fazer o quê?
Prefeito – Ora, se pudesse mandar pra casa seria ótimo, mas faça o seguinte: bota todo mundo pra olhar camelô. Não quero nenhum camelô nas ruas!
Secretário – Mas, Prefeito, nós não temos tantos camelôs assim, talvez uma meia dúzia...
Prefeito – Já é muito! Meia dúzia é um absurdo! Tira todo mundo!
Secretário – É muito Fiscal pra meia dúzia de camelô.
Prefeito – Ora, inventa alguma coisa. Bota Fiscal pra fazer atendimento.
Secretário – E o pessoal do atendimento?
Prefeito – Ora, sei lá, manda gente pra Saúde, pro raio que o parta! Será que você quer que eu ainda administre a sua Secretaria? Tenha paciência...
Desce o pano.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XIV

Cenário: Gabinete do Procurador da Câmara Municipal do Município de Vaiquemquer. Personagens: Procurador e Vereador recém-empossado.
Sobe o pano.
Vereador – Bom dia, doutor! Eu preparei um projeto de lei e queria mostrar ao senhor.
Procurador – Pois não, vereador. Qual é o tema do projeto?
Vereador – É uma lei que proíbe o uso de piercing nas partes íntimas das pessoas. O senhor não acha isso uma aberração?
Procurador – Meu vereador, eu não acho nada, minha função é apenas analisar os aspectos jurídicos...
Vereador – Eu escrevi aqui (lendo): “Fica proibida a aplicação de piercing nas partes íntimas das pessoas”. Está bom?
Procurador – A lei é só isso?
Vereador – Ah, tem o outro artigo (lendo): “Revogam-se as disposições em contrário”. Está bom?
Procurador – O senhor tem que definir algumas coisas... Por exemplo, o que se entende como partes íntimas?
Vereador – Ora, todo mundo sabe quais são as partes íntimas...
Procurador – Depende da visão de cada um... Por exemplo, bico de peito é parte íntima?
Vereador – Ah é sim! Intimíssima!!
Procurador – E bico de peito de homem, também é parte íntima?
Vereador – Bem... De homem, não, só de mulher...
Procurador – As mulheres não vão achar que isso é discriminação?
Vereador – Huum... É verdade... Está certo, peito de homem também não pode.
Procurador – E piercing na língua? Pode?
Vereador – Na língua? Que coisa horrível! Também não pode!
Procurador – Mas a língua é parte íntima?
Vereador – Intimíssima!! A língua tem que ficar escondida na boca...
Procurador – E umbigo? É parte íntima?
Vereador – Intimíssima!! No umbigo também não pode.
Procurador – Outra coisa, a lei tem que definir o que é piercing...
Vereador – Todo mundo sabe o que é piercing... Diz que é uma espécie de brinco preso na pele.
Procurador – Tudo bem, eu dou um jeito... E qual vai ser a sanção?
Vereador – Nem Sansão nem Dalila, a lei vale pra todo mundo!
Procurador – Desculpe, eu quis dizer qual vai ser a multa?
Vereador – E precisa dizer isso?
Procurador – Ora, se alguém for apanhado desobedecendo à lei, qual vai ser a punição?
Vereador – Vai preso!!
Procurador – Meu vereador, nós não somos polícia para prender alguém. Temos apenas que multar...
Vereador – Há controvérsia, não há? Eu ouvi dizer que a Prefeitura tem poder de polícia...
Procurador – Polícia administrativa e não polícia judiciária.
Vereador – Bem... O senhor é que entende disso... O senhor põe aí a multa que achar melhor...
Procurador – Está certo... Vou pensar... E quem vai fiscalizar?
Vereador – Ora... A Postura, não é isso?
Procurador – Pode ser a fiscalização de posturas como pode ser a Vigilância Sanitária.
Vereador – Boa ideia! Acho melhor a Vigilância Sanitária! Esse negócio de piercing pode dar infecção, é problema de saúde!
Procurador – Me diz uma coisa, como é que a Vigilância Sanitária vai fiscalizar se alguém está usando piercing na parte íntima?
Vereador – Ora, fiscalizando esses aplicadores de piercing, pegando de surpresa...
Procurador – Está bom, está bom... Eu dou um jeito... Só isso, meu Vereador?
Vereador – Ah não! Eu tenho outro projeto de lei!
Procurador – (Meu Deus!)
Vereador – O senhor disse alguma coisa?
Procurador – Não, eu quero saber qual é o tema desse outro projeto?
Vereador – É uma lei que proíbe tirar meleca na área pública!
Desce o pano.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XIII

Roteiro: Maria e Pedro são dois Fiscais Tributários com mais de 30 anos de serviços. Não se aposentam por que a lei exclui dos proventos o adicional de produtividade, que representa 70% de seus rendimentos. São obrigados, então, a continuar trabalhando. Numa certa manhã de segunda-feira:
Sobe o pano.
Maria – Bom dia, Pedro... O café já chegou?
Pedro – Não... A garrafa ainda tem café de sexta-feira... Luisinho melhorou?
Maria – Mais ou menos... Continua tossindo... Vou levá-lo no posto de saúde...
Pedro – Não leva hoje não! Hoje é o Dr. Pirróida!
Maria – Aquele maluco? Vou amanhã, deve ser o Dr. Madaleno... Gente fina...
Pedro – Você viu a nova lei do ISS? Foi publicada hoje.
Maria – Nova lei? Nem sabia que estavam fazendo uma nova lei.
Pedro – Aquele advogado novo, que se formou no ano passado, convenceu o Prefeito...
Maria – Ah, sei quem é... Vem todo dia de terno e gravata?
Pedro – Esse mesmo. Dê uma olhada na lei (estendendo um papel). Têm coisas que não entendi...
Maria – Nossa! Tudo isso?
Pedro – Veja aí o Capítulo XXXIV – Da Base de Cálculo.
Maria – Deixa eu achar... Achei! Vou ler: “A base de cálculo do imposto é a quantificação da grandeza financeira do fato tributário, mensurado de acordo com a realidade que se pretende medir, com a adoção da seguinte fórmula:
Ht/Fjt = Ct/Rjt, donde:
Ht = Hipótese Tributária;
Fjt = Fato Jurídico Tributário;
Ct = Consequência Tributária;
Rjt = Relação Jurídica Tributária.
Pedro – Não entendi nada... Você entendeu?
Maria – Estou tentando... Puxa! Eu acho, Pedro, que nós estamos ficando velhos...
Pedro – É mesmo... Era tão fácil... “A base de cálculo é o preço do serviço”, tão fácil de decorar.
Maria – Você perguntou aos colegas? Essa turma nova que está aí...
Pedro – Está louca! Vou me rebaixar! Eles vieram perguntar pra mim!
Maria – E o que você disse?
Pedro – Ora, eu disse que eles são uns burros, que a lei é claríssima! Que eles tratem de estudar!
Maria – E eles?
Pedro – Ficaram com vergonha e sumiram.
Maria – Você fez bem, não podemos dizer que não entendemos, a gente perde a moral.
Pedro – Pois é, mas, cá entre nós, eu acho que estamos ultrapassados. Esse cara de terno e gravata vive falando em quantum debeatur, exegese, endornas... Outro dia, ele falou num tal de conectivo lógico conjuntor... Olha aqui! Eu até escrevi pra não esquecer.
Maria – Isso não é coisa de informática, de eletrônica?
Pedro – Não! Ele falava de coisa tributária.
Maria – Eu acho, Pedro, que devemos ficar na nossa, fazer o nosso servicinho e não dar conversa pra ninguém.
Pedro – Concordo.
Maria – Mas veja se não fica com esse sorriso de velho babão pra cima das Fiscais novinhas, que elas correm pra te fazer perguntas!
Pedro – Eu estou preocupado com os Contadores. Vão fazer fila para perguntar o que significa isso.
Maria – Ora, se eles perguntarem vamos dizer que é uma forma sofisticada de dizer que a base de cálculo é o preço do serviço, e fim de papo.
Pedro – Está certo... Vamos até o bar tomar um cafezinho por que esse aqui vai demorar.
Desce o pano.

domingo, 12 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XII

Local: uma pequena cidade de Santa Catarina. Cenário: Prefeitura - Central de Atendimento ao Contribuinte. Personagens: um alemão zangado (seria pleonasmo?) e a atendente.
Sobe o pano.
Alemão - Bom dia! Eu querro pagar duas vezes a taxa de coleta de lixo.
Atendente (confusa) - O senhor quer pagar duas vezes a taxa de coleta de lixo?
Alemão (irritado) – A senhorra é burra mesmo! Serrá que vai ficar repetindo o que eu falo?
Atendente (constrangida) – O senhor me desculpe, mas nunca vi ninguém querendo pagar duas vezes um tributo.
Alemão – Pois eu querro pagar duas vezes. Faz favor de fazer guia.
Atendente – Mas meu senhor, a taxa é uma só...
Alemão – Mas eu querro pagar duas!
Atendente – Por que o senhor quer pagar duas vezes?
Alemão – Porque eu querro que o caminhon recolha o lixo da minha casa duas vezes por semana. O caminhon só passa na segunda-feirra e eu querro que passe também na quinta-feirra.
Atendente – Mas... Isso é impossível...
Alemão – Por que impossível se eu vou pagar duas vezes a taxa?
Atendente – O senhor não pode pagar duas vezes. A taxa é uma só!
Alemão – A senhorra é burra mesmo! Será que eu não falar português clarro? Eu querro pagar duas taxas parra aumentar o serviço de pegar o lixo da minha casa!
Atendente – Se a finalidade é de melhorar o serviço, o senhor procura a Secretaria de Urbanismo... Talvez eles possam quebrar o galho...
Alemão (furioso) – O quê!!! Quebrar a galho!!! Eu não querro favor de ninguém!! Eu querro pagar!!
Atendente – Mas meu senhor, mesmo que o senhor pague duas vezes, se fosse possível, o serviço seria o mesmo.
Alemão – A senhorra pensar que eu ser burra? Depois de pagar, vou no serviço de caminhon, provo que paguei e mando tirrar lixo duas vezes.
Atendente – Infelizmente não posso fazer isso.
(O alemão respira fundo, olha para o alto, procura acalmar-se)
Alemão – O Hermann está aí?
Atendente – O Prefeito?
Alemão – Porracaso tem outro Hermann na Prefeitura?
Atendente – Bem... Acho que o Prefeito está lá no Gabinete... O senhor conhece ele?
Alemão – Hermann ser filho do meu amigo Johann; Hermann também ser outra burra mesmo, mas pelo menos posso falar com ele em alemon e ele vai entender o que eu querro... Por que... A senhorra não entender nada... É burra mesmo!
Desce o pano.

sábado, 11 de junho de 2011

Manicômio Fiscal XI

Roteiro: a empresa de informática “Lançatudo.com”, especializada em sistemas tributários, convenceu o Prefeito de que o seu programa triplicaria a receita em menos de um mês. Animado, o Prefeito promoveu a sua compra, cuja instalação foi festejada em pompa e circunstância. No dia seguinte...
Sobe o pano.
Fiscal senta diante do monitor e liga o sistema.
Monitor – Inicializando o programa Lançatudo. Aguarde um instante...
O Fiscal aguarda. Fica olhando o monitor, a rodinha rodando, rodando, rodando... Quinze minutos depois, resolveu levantar-se, tomar um café e discutir futebol com os colegas da Seção. De vez em quando, dava uma espiada no monitor.
Monitor – Inicializando o programa Lançatudo. Aguarde um instante...
De repente, abre o programa! O Fiscal, animado, volta a sentar-se diante do Monitor.
Monitor – Abra o Menu e clique no link desejado.
O Fiscal abre o Menu e surge um cardápio de uns duzentos serviços. O Fiscal procura a palavra “Cadastro” e finalmente a encontra, porque o cardápio não está em ordem alfabética. Clica em “Cadastro”.
Monitor – Inicializando o sistema de Cadastro. Aguarde um instante... E a rodinha rodando, rodando, rodando...
Dez minutos depois, surge uma tela nova com a seguinte mensagem:
Monitor – Digite a inscrição ou a razão social do contribuinte.
O Fiscal quer saber exatamente a inscrição e, assim, digita o nome: “Banco do Brasil S.A.”
Monitor: Inicializando a busca. Aguarde um instante... E a rodinha rodando, rodando, rodando...
O Fiscal aguarda. Algum tempo depois, surge a mensagem:
Monitor – A razão social solicitada não consta do cadastro. Verifique se o nome digitado está correto.
O Fiscal apaga o S.A. e deixa apenas “Banco do Brasil”.
Monitor: Inicializando a busca. Aguarde um instante...
O Fiscal se distrai olhando a rodinha rodando, rodando, rodando...
Surge a mensagem:
Monitor – A razão social solicitada não consta do cadastro. Verifique se o nome digitado está correto.
O Fiscal chama um colega que fez curso de informática.
Fiscal – Pafúncio!! Como é que consigo a inscrição do Banco do Brasil nesse sistema?
Pafúncio – Acho melhor você perguntar à Dona Vera.
O Fiscal se levanta e vai ao Cadastro procurar Dona Vera, trinta anos de serviço no Cadastro, tem tudo guardado na cabeça.
Fiscal – Dona Vera, a senhora sabe a inscrição do Banco do Brasil?
Dona Vera – A inscrição do Banco do Brasil da Rua da Matriz é 5.008; o da Rua do Carmo é 22.472; e a agência da Avenida Getúlio Vargas é 53.759.
O Fiscal agradece e retorna ao computador. Apaga a razão social e digita a inscrição 5.008.
Monitor – Inicializando a busca. Aguarde um instante... De repente, a tela congela e a rodinha para de rodar.
Fiscal – Pafúncio!! Parece que o sistema deu pau!
Pafúncio se aproxima, dá uma olhada, mexe no ratinho, nada.
Pafúncio – Acho bom você telefonar para a empresa. Esse número 0800 que está colado no computador.
Fiscal – Esse aqui?
Pafúncio – Não, cara! Esse é da pizzaria, aquele ali, junto do adesivo da farmácia.
O Fiscal pega o telefone e disca o número.
Telefone – Obrigado por telefonar ao Lançatudo! Digite 1 se for pagamento de fatura, digite 2 se for emissão de segunda via de fatura, digite 3 se for parcelamento de dívida... Digite 14 se for referência à mãe do Diretor Presidente, digite 15 se for comentário ou fofoca...
Fiscal – Pafúncio!! Qual é o número que eu digito?
Pafúncio – Digita qualquer um que eles atendem.
O Fiscal digitou um número qualquer.
Telefone – Os ramais estão ocupados. Aguarde um instante ou ligue mais tarde. E começa uma musiqueta.
O Fiscal aguarda, com os dedos tamborilando a mesa. Tenta adivinhar a música que está tocando (“acho que é Vivaldi, as Quatro Estações... Essa parte é Verão ou Primavera?). Quando a música já estava no Inverno, a ligação cai.
Fiscal – Pafúncio!! A ligação caiu!!
Pafúncio – Afinal, o que você quer?
Fiscal – Eu quero saber se o Banco do Brasil pagou o ISS do mês passado.
Pafúncio – Ora, volta lá na Dona Vera que ela te informa tudo.
E lá vai o Fiscal, a procura de Dona Vera, assobiando o refrão da Primavera de Vivaldi, realmente um calmante às aflições do cotidiano.
Desce o pano.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Manicômio Fiscal X

Uma pequena cidade de Minas Gerais, população de uns seis mil habitantes.
Sobe o pano. Cenário: Setor de Atendimento ao Contribuinte. Personagens: a Servidora atendente e o modesto contribuinte, mineiro de sangue, tradição e desconfiadíssimo.
Contribuinte – Bom dia, eu queria, sabe, aquele papel para pagar o IPTU da minha casa.
Servidora – Uai, gente! O senhor não sabe não? O Prefeito isentou todo mundo de pagar o IPTU!
Contribuinte – O Prefeito fez o quê?
Servidora – Deu isenção! Agora ninguém precisa pagar o IPTU.
Contribuinte – Mas... Isso está escrito?
Servidora – É claro, uai! É lei escrita e assinada!
Contribuinte – Mas... Que trem doido! Então, o Prefeito vai pagar o meu IPTU?
Servidora – Não!! Ninguém paga, é de graça!
Contribuinte – Quer dizer que ninguém mais paga IPTU?
Servidora – Isso mesmo!
Contribuinte – Mas... E quem vai pagar as despesas da Prefeitura?
Servidora – Ora... Deve ser o Governo Federal, não é mesmo?
Contribuinte – Então, eu tenho que pagar o IPTU no Governo Federal?
Servidora – Não!! O senhor não precisa pagar a ninguém!
Contribuinte – Mas... Que trem esquisito... A senhora, por favor, me diz o seguinte: como vou provar que quis pagar e não pude pagar?
Servidora – Ora, uai, não precisa provar nada, é a lei.
Contribuinte – Mas... Se um dia a Prefeitura resolve tomar a minha casa, como vou provar que o Prefeito pagou o IPTU no meu lugar?
Servidora – Uai, gente! Eu já disse que o Prefeito não vai pagar nada!
Contribuinte – Está certo, mas como vou provar que a Prefeitura não quis cobrar?
Servidora – O senhor vem aqui e pede uma certidão negativa.
Contribuinte – Que trem é esse?
Servidora – É um papel que prova que o senhor está em dia com o IPTU.
Contribuinte – Mas como a Prefeitura vai me dar um papel dizendo que estou em dia se não paguei?
(A Servidora começa a ficar nervosa)
Servidora – Minha Nossa Senhora! Tem uma lei que prova que o senhor não precisa pagar o IPTU!
Contribuinte – Ah, bom. Essa lei tem o meu nome direitinho? Olha que eu sou José Honofre, com H na frente. Muita gente escreve o meu Honofre sem H.
Servidora – A lei não tem nome de ninguém! Serve para todos!
Contribuinte – Olha, a senhora me desculpa, sei que a senhora é honesta, mas não estou gostando dessa história não. Eu preciso de um recibo que diz, tudo direitinho, que o meu imposto está em dia.
Servidora – Mas eu não tenho recibo nenhum para entregar ao senhor!
Contribuinte – Faz, então, o seguinte, por favor: vai lá dentro, procura o Prefeito e pede a ele o recibo do IPTU da minha casa.
Servidora – Meu bom Jesus!! O Prefeito não tem o seu recibo!
Contribuinte – Ora, não é possível, será que ele perdeu?
Desce o pano.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Manicômio Fiscal IX

Sobe o pano. Cenário: Sala do Chefe de Gabinete do Prefeito. Personagem inicial: o Chefe do Gabinete.
(o telefone toca)
Chefe do Gabinete – Alô! Sim... Sim, Prefeito.
Prefeito (do outro lado da linha) – Feitosa, presta atenção! Eu passei agora na Rua da Chamuscada e tem um sujeito levantando um muro no meio da calçada! Pede ao Sargento Orozimbo para dar uma olhada nisso (e desligou).
O Chefe do Gabinete liga para o Sargento Orozimbo.
Chefe do Gabinete – Sargento! O Prefeito deu ordem expressa para enviar uma viatura na Rua da Chamuscada. Tem um sujeito que está levantando um muro no meio da calçada. É urgente!!
Sargento Orozimbo – Positivo, Chefe! Vou providenciar agora! (e desligou).
O Sargento Orozimbo vai até a sala dos Fiscais de Posturas.
Sargento Orozimbo – Quem está de plantão?
Fiscal Oliveira – Sou eu, Chefe.
Sargento Orozimbo – Vá correndo até a Rua da Chamuscada que tem um maluco construindo um muro no meio da calçada. Manda o cara derrubar aquilo! Ordem do Prefeito! Acabou de me ligar!
Fiscal Oliveira – Perfeitamente! Já estou indo!
O Fiscal Oliveira vai correndo até a garagem, onde ficam os veículos da Prefeitura. Procura o Chefe da Garagem.
Fiscal Oliveira – Seu Honorato! O Prefeito mandou pegar uma retro para derrubar um muro. Tem que ser agora!
Seu Honorato – Pode ser aquela, mas quem vai dirigir?
Fiscal Oliveira – Sei lá, eu é que não sou, não sei dirigir essa máquina. Não tem ninguém aí?
Seu Honorato – Cadê o Chico? Chico!! Vem cá!
(O Chico se aproxima)
Chico – O que foi, Chefe?
Seu Honorato – Tem um serviço pra fazer. Vê aí com o Oliveira.
Fiscal Oliveira – O Prefeito mandou derrubar um muro na Rua da Chamuscada.
Chico – Que muro?
Fiscal Oliveira – Um muro que o cara está fazendo no meio da calçada.
Chico – É só derrubar?
Fiscal Oliveira – Isso! É só derrubar.
Chico sobe na máquina e vai embora. Ao chegar na Rua da Chamuscada, vê o muro, direciona a retro e vai em cima. O construtor, quando vê a máquina se aproximando, sai correndo aos gritos de socorro. A máquina destrói o muro.
(De novo na sala do Chefe do Gabinete. O Prefeito chega)
Chefe do Gabinete – Prefeito, a ordem foi cumprida.
Prefeito – Que ordem?
Chefe do Gabinete – De derrubar o muro na Rua da Chamuscada.
Prefeito – Derrubar? Eu mandei o Orozimbo dar uma olhada...
Chefe do Gabinete – Prefeito... Tem um probleminha...
Prefeito – Que probleminha?
Chefe do Gabinete – Sabe aquele Chico, da Garagem, que dirige a retro?
Prefeito – Huum... Acho que sei... O que tem ele?
Chefe do Gabinete – O senhor sabe que ele foi preso e internado lá no manicômio?
Prefeito – É mesmo? Quando eu lhe digo que estamos cercados de malucos, você não acredita. Me traz um café!
Desce o pano.