Recebi de um
Fiscal uma mensagem que expressa o pensamento abaixo. Fiz alterações no texto
para não prejudicar o sigilo da procedência, mas o sentido permanece exatamente
o mesmo. Talvez esteja aí o fiel retrato da fiscalização dos pequenos
municípios brasileiros. Um problema que se torna eterno e não se resolve.
Prezado Dr. Roberto Tauil,
Gostaria de parabenizá-lo pelos artigos publicados
por sua empresa. Já li vários artigos, mas um deles chamou a atenção, um que
trata do planejamento da fiscalização tributária, porque estamos, justamente
agora, pleiteando uma reestruturação das nossas atividades. O nosso cargo é
intitulado “Fiscal”. Somos um total de quatro “Fiscais”, num Município que tem
uma população em torno de 30 mil habitantes.
Naquele artigo, parece que o senhor comentava a
nossa situação. Como disse, o nosso cargo é de “Fiscal”, com as seguintes
atribuições e funções da forma disposta na nossa lei municipal:
Atribuições
do cargo: Fiscaliza estabelecimentos
comerciais, feiras, diversões públicas, bares, casas de jogos, comerciantes
autônomos e outros, também os tributos municipais, inspecionando
estabelecimentos industriais, de prestação de serviços e demais entidades, e
ainda, as obras de construção civil, verificando o cumprimento das legislações
pertinentes, a fim de fazer cumprir a política do município. Executa tarefas
correlatas determinadas pelo superior imediato.
Funções do
Fiscal; Taxas; Tributos; Impostos;
Emolumentos; Contribuição de Melhoria; Hierarquia; Direitos e deveres do
funcionário; Fiscalização de Feiras Livres; Comércio ambulante; Legislação
Municipal Específica; Chefia e Liderança.
Conforme
acima, percebe-se a amplitude de atribuições e funções do nosso cargo. Como o
senhor disse no artigo, estamos enquadrados entre os Fiscais Genéricos, ou
Fiscais do Faz Tudo. Ou seja, Abrangência total, Especialização zero.
Pois é,
fazemos de tudo: examinamos projetos de obras de construção; fiscalizamos
estabelecimentos sem inscrição municipal; fiscalizamos e punimos quem lança
lixo nas ruas; entregamos correspondência da prefeitura; reprimimos invasões de
áreas; expulsamos ambulantes; laçamos animais nas ruas. Enfim, qualquer
problema urbano nós é que resolvemos.
Por isso,
não temos sede ou instalações. Trabalhamos na rua, e temos uma salinha para,
uma vez por dia, apanhar e devolver processos. Tipo sala individual, onde só
cabe um de cada vez. Fazemos fila na porta, esperando que o colega resolva suas
coisas e saia.
Bem, os munícipes
fiscalizados ficam na dúvida da legalidade desse nosso amplo poder
fiscalizador. Não deixam de ter razão. Enfim, em certo momento somos
engenheiros de obras; somos inspetores de lixo; somos vigilantes sanitários;
somos do meio ambiente; somos até carteiros. Se não fosse a miséria do salário,
ficaríamos até orgulhosos de tanto poder.
Mas, na
verdade, nada contribuímos na arrecadação de impostos. A chefia não nos dá
ordens de fiscalizar o ISS. O IPTU é lançado internamente e nossa função é de
carteiro, entregar as guias nas casas. O ITBI, ninguém sabe como funciona, mas
o Cartório, vez por outra, pede a emissão de guia, já fornecendo os dados e
valores. Uma festa quando isso acontece, porque não sabemos o motivo de uns
pagarem e outros não pagarem. O Oficial do Cartório não tem paciência de
explicar os motivos, e a chefia não quer aborrecer o homem, amigo de certas
autoridades.
Contudo, somos
bons em multar! Multamos todas as infrações: lixo na rua, estabelecimento sem
alvará, obra sem licença, estacionamento irregular. Quando a gente anda nas
ruas, os infratores se escondem... Bem, os pequenos infratores, os grandes não
são da nossa competência. Vez em quando, só de farra e para irritar os
gestores, multamos um grande, dando-lhe o trabalho de comparecer nos gabinetes
para rasgar a multa, junto com o processo.
É assim a
nossa vida de trabalho, Dr. Tauil. O nosso grande desejo seria que surgisse um
novo gestor, que entendesse realmente de administração fazendária e colocasse
as coisas nos seus devidos lugares. Que soubesse instituir normas e
procedimentos administrativos adequados; que soubesse dividir as funções dos
cargos de carreira; que soubesse organizar os cadastros; que soubesse
informatizar os controles; que soubesse como arrecadar.
Enquanto não
surge, ficamos assim: ganhando pouco e fingindo-se de fiscais.
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