Repercutiu o resultado do Censo de 2010 do IBGE ao registrar o aumento de 11,4% da população indígena no Brasil, comparado aos dados referentes ao ano de 2000. Quando lembramos o genocídio praticado no passado, o extermínio total de tribos indígenas, como ocorreu com os Goitacás, os Botocudos e tantos outros, a notícia não deixa de ser auspiciosa. Outra novidade surpreendente foi o aumento do número de indígenas nos centros urbanos, nada menos que 36,2% da população indígena total.
Aqui na comunidade, como não podia deixar de ser, também temos uma tribo indígena. Ela surgiu quando correu a notícia que um pedaço da nossa terra era, no passado, local sagrado, talvez tenha sido um cemitério índio, e a tribo tratou logo de ocupar o espaço e montar sua aldeia. Na verdade, nenhum esqueleto foi encontrado, mas a presença de sambaquis serve de prova evidente que a área foi ocupada por índios no passado e deve então ser preservada. Sambaquis são acúmulos de conchas provenientes da coleta de moluscos. Os índios iam jogando as cascas em determinado local que acabava se transformando numa espécie de lixeira ou aterro sanitário.
Há certa discussão sobre a origem do tal sambaqui, pois os pescadores da região dizem que, antigamente, também acumulavam as cascas de siris, ostras, mexilhões e outros moluscos naquele local. Para evitar mau cheiro e a presença de urubus e ratos, de tempo em tempo cobriam as cascas com a areia da praia. De qualquer forma, os índios estão lá e afirmam que aquele sambaqui é marca registrada indígena e de lá não sairão, a não ser se as negociações com o governo e empresas imobiliárias redundarem em sucesso.
Por curiosidade, fui até lá conhecer os novos membros da comunidade, sendo recebido por um índio enorme, branco, louro e olhos azuis, que se chama Eckart Thamstein. Ele usa bermuda e um cocar de coloridas penas artificiais fabricadas na China. Disse o índio ter nascido em Dusseldorf, mas sempre quis ser índio, desde pequenino. Entre uma cerveja e outra contou que sempre torceu a favor dos índios nos filmes de faroeste e odiava o General Custer. Por este motivo, deixou a Alemanha e juntou-se à tribo dos seminoles na Flórida, onde trabalhou como bookmaker num dos cassinos temáticos da tribo. Mas os nativos americanos, muito desconfiados, não adotam índios brancos, fato comum aqui em nossas terras. E foi assim que, desiludido, largou os seminoles e veio para o Brasil. Todavia, dizem à boca pequena que Eckart fugiu após dar um desfalque no cassino, e os seminoles estão atrás do seu escalpo.
Foi bom ter ido até lá, pois encontrei velhos conhecidos. Uma senhora, antiga vizinha na minha rua, contou-me que gostava de fantasiar-se de índia nos carnavais, e esse espírito índio parece que se incorporou e agora não quer ser outra coisa. Eu me lembrei que ela foi embora da minha rua depois que o marido fugiu de casa com a empregada, mas fui discreto e nada comentei. “Aqui, não pago pitiú, não pago água, não pago luz, a comida é dividida para todos e ninguém manda em mim”, disse a senhora enquanto fumava um enorme charuto da paz. Ela agora se chama Maria Arinhã.
O cacique gostou de mim e disse que ainda têm vagas de índio, caso me interesse. Estou pensando no convite, e amanhã pretendo dar um pulo até o Saara e ver preço de cocar e de penas chinesas. Dependendo do preço, quem sabe...
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