terça-feira, 25 de junho de 2013

Efeitos do dia de fúria na comunidade

Depois das violentas manifestações da população da comunidade, o seu Manuel, dono da padaria e líder político da situação, reapareceu e marcou uma reunião tripartite: políticos da situação; assessores dos políticos da situação e puxa-sacos da oposição. Compareceram: Daniel da banca de jornal; Índio das Verduras e Chinelinho, os dois únicos candidatos a vereadores da comunidade na última eleição; o Brilhantina, padeiro do seu Manuel; e Dóris Day, a lourinha caixa da padaria. O Henheco, o extremista, não compareceu por estar em local ignorado e não sabido.

Seu Manuel fez um discurso emocionante, que levou Dóris Day às lágrimas. Disse, inicialmente, que respeitava e aceitava as manifestações do povo, mas, por precaução, contratou cinco seguranças fortemente armados e alugou um caminhão pipa para jogar água nos manifestantes não muito pacíficos.

Em razão das críticas relativas à mobilidade, vai instalar um bicicletário na frente da padaria, e não cobrará pedágio dos usuários, pelo menos por enquanto. Vai disponibilizar, também, um aparelho manual de encher pneu para quem quiser. O aparelho vai ficar no caixa da padaria e amarrado com uma corda, para ninguém roubar.

Em relação à saúde, prometeu não reaproveitar mais os copos de plásticos descartáveis. A partir de agora, os copos usados serão jogados no lixo. E ali mesmo deu ordem ao Brilhantina para não tirar meleca quando estivesse preparando a massa do pão. Com um sorriso matreiro, seu Manuel disse que ninguém sabia disso, mas ele sabia. E mais uma nova ordem sobre o pão: os fregueses que encontrassem cocozinho de rato no pão poderiam levar de volta e trocar por outro, desde que estivessem intactos, sem nenhuma mordidinha.

A respeito da educação, prometeu não falar mais palavrão aos fregueses, exceto aqueles mais triviais e usados no convívio da família. “Afinal, porra, esses palavrões saem naturalmente”, explicou seu Manuel. Dóris Day aproveitou para pedir que ninguém mais passasse a mão na bunda dela, mas a moção foi rejeitada por unanimidade.

E, finalmente, seu Manuel conclamou o povo a fazer um plebiscito para mudar algumas regras tradicionais. Disse ele: “O problema não está na gestão, mas nas regras que somos obrigados a cumprir”. Citou, como exemplo, alguns jornais caluniosos que o Daniel estampava na banca. “Esses jornalecos devem ser proibidos, pois só sabem criticar nossa gestão”. Mencionou Henheco: “pessoas do tipo deste Henheco devem desaparecer da face da terra. São venenosos e perigosos”. E, por fim, pediu ao povo que ficasse em suas casas ou na igreja, fazendo suas orações, em vez de sair às ruas e correrem o risco de ser assaltados. “Somente saiam às ruas para comprar pão e nos dias de eventos artísticos”. E prometeu um show na praia com a banda de pagode Tring Ling.

Todo mundo saiu satisfeito da reunião, mas com uma sensação de que faltou alguma coisa.

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