sexta-feira, 11 de maio de 2012

No limite

Conversando com um empresário da área de crédito consignado, vim a saber que o maior número de servidores públicos tomadores de empréstimo consignado tem um salário de até dois salários mínimos. Não em volume de valor, mas em número de operações. E a grande maioria, depois do primeiro empréstimo, não sai mais do endividamento, como se fosse um vício, sempre a raspar todo o saldo que o limite permita.

“Vivem de um salário imaginário”, diz o meu amigo. “O consignado já é parte do rendimento, uma bola de neve a descer um barranco seco”. Pensei numa bola de neve a descer o barranco seco. “Então, ela derrete e diminui”, argumentei. Ele respondeu: “Não, porque a cada derretida acrescenta-se mais uma pá de neve, na verdade, uma pá de juros e encargos”. E concluiu: “estão endividados até o pescoço, a sobrevivência chegou ao limite”.

Pensei nos americanos, no tal american way of life, do lado mais perverso, um estilo de vida de fantasia, um tanto american dream, uma ilusão nutrida de rendas imaginárias, com hipotecas redobradas de suas casas, com o carrão estacionado na calçada, financiado no leasing a perder de vista, com mobiliário requintado para pagamento em 48 parcelas, com as compras do supermercado devidamente pagas no cartão de crédito a prazo, com TV de plasma, iPad e tudo mais que a propaganda nos impõe a corroer a nossa fugaz resistência, tudo fácil, adquirido em módicas e suaves prestações.

O mais curioso é que os juros altos ainda conseguiam segurar um pouco a sanha consumista do brasileiro, de um lado a aplacar a volúpia do gasto supérfluo, de outro a restringir o limite de crédito disponível. O chefe ou a chefe da família, com dor no coração ainda resistiam às investidas dos familiares, principalmente das crianças, aos novos desejos de consumo, deixando aquela excursão para outro mês (toda a vizinhança vai, menos a gente, que vergonha), adiando a compra daquele tênis reebock super incrementado (todo mundo na escola tem!), sem dúvida, uma árdua missão.   

Mas agora chegam as alvissareiras notícias dos juros baixos. E os afoitos endividados, esperançosos de conseguirem um limite maior, nem que seja um limitezinho a mais, qualquer coisa serve, correm aos bancos para aumentar o endividamento. E aí recebem a notícia de um gerente simpático, que a coisa não é bem assim, juros reduzidos somente para clientes especiais, aqueles que não precisam de dinheiro, aqueles que ainda resistem ao chamariz do consignado. Pois é, eles querem pegar o resto dos servidores, aqueles poucos que ainda não estão no limite.

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