Resolvi suspender a série dos Manicômios porque já não estou vendo graça nenhuma nessa loucura tributária generalizada. Com a idade, situei-me na faixa da rabugice e da casmurrice e daqui não sairei mais.
Os jornais, sem mais notícias, cansam-nos a publicar as tramoias encachoeiradas dos políticos. E tudo gira em torno dos grampos telefônicos, cada dia a divulgar pedaços das conversas dos supostos malfeitores. Fica a pergunta inevitável: se todos eles sabem que os seus telefones estão grampeados, por que continuam a usá-los? Respondo prontamente: porque o telefone transformou-se num vício! Uma doença!
Os caras sabem que estão grampeados, mas não resistem, continuam a usar os telefones. Chegam até a iniciar a conversar com o alerta: “cuidado, este telefone está grampeado, tem gente ouvindo nossa conversa”. E o outro: “então, vou falar em código... O pirulito já foi chupado”. “Que pirulito?”, pergunta o outro. “Estou falando em código, entendeu? Você tem que aprovar a liberação de outro pirulito”, responde o piruliteiro. “Ocê não podia mudar esse código? Não estou gostando desse trem de chupar pirulito”. “Tá bom! O canavial já foi queimado, tem que plantar outro, entendeu agora?” Não há dúvida que esse negócio de codificar conversa é assunto complexo, às vezes a exigir até programação e sistemas operacionais, alguns já oferecidos na praça a preços razoáveis. Mas não deixam de usar o telefone! Um recadinho no papel, a contratação de um courrier, um motoboy, um encontro no banco da praça, nada serve, tem que ser por telefone.
Por isso, em minhas reflexões humanísticas, concluo que o mal da corrupção é o telefone. Abolido o uso do maldito aparelho, extinta será a corrupção!
Vocês já perceberam o comportamento das pessoas nas ruas? São verdadeiros zumbis, a andarem sem rumo, a esmo, e com o olhar fixo naquele aparelhinho, lendo mensagens ou vendo fotos, tudo certamente de urgência urgentíssima, pois precisam ler ou ver aquilo naquele exato momento, não importa se na rua, no escritório, durante uma reunião, na mesa de cirurgia, na tribuna do Senado, no banheiro em meio às suas necessidades naturais. Outro dia fui a um casamento e os noivos, ao pé do altar, a olharem os seus aparelhinhos enquanto o padre falava. E aquele sorrisinho demente estampado em seus rostos. Alguém ao lado me explicou: “estão lendo as mensagens de felicitações”. Ah, bom.
Aliás, esses aparelhinhos novos, que você escreve em vez de falar, foram desenvolvidos, assim acredito, para as pessoas com rouquidão crônica, mudez ou, então, para aqueles que têm vergonha da própria voz – muito fina ou muito grossa -, mas, todos de excelente capacidade visual, pois somente os superdotados acertam aquelas letrinhas miúdas. E como são rápidos na transmissão de seus profundos pensamentos numa linguagem, é claro, engenhosamente codificada: “ki ta faz?” “To kasa” “k 1 saco”. As frases são curtas, mas a conversa é longa, dura horas ou dias.
Mas isso é outra história, falo do vício do uso do telefone. Um avião ainda está a taxear (ou será taxiar?) na pista e a maioria dos passageiros já começa a ligar os seus aparelhos. Paira no ambiente fechado do avião um ar de ansiedade latente, não de chegar ao destino, de terminar o vôo, de pisar em solo firme, mas de poder falar com alguém por telefone. Nos restaurantes, as pessoas não sabem se comem ou se falam. Não tiram os olhos do aparelhinho, colocado estrategicamente ao lado do prato. Outro dia, o sujeito engoliu o telefone, sem intenção, é lógico, foi socorrido, tiraram o telefone do seu estômago e o aparelho ainda fazia aquele barulhinho de nova mensagem. A mensagem foi atendida e tudo resolvido, felizmente.
Pois quero lançar a campanha contra o uso doentio do celular e suas variações (smart phone ou o nome que o valha). O Ministério da Saúde deveria exigir um letreiro na tela do celular com a mensagem: “Use com moderação”. Ou, então, algo mais drástico, tipo uma foto de um telefoneiro sendo atropelado por não estar prestando atenção ao trânsito. Eu colocaria logo um plástico no carro com aquele aviso importantíssimo, a marcar diferença: “Eu apoio”.
Bem, paro por aqui porque o meu celular está tremelicando e preciso atender.
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