O eleito era uma pessoa de, vamos
dizer assim, ideias curiosas e aparentemente extravagantes. O povo se divertia
com suas elucubrações. Dava risadas. Mas o sujeito parecia falar sério, cara
enfezada, dando socos na mesa, quando tinha mesa, ou na outra mão, quando não
tinha a quem esmurrar. Aquele comportamento era motivo de maior diversão ainda.
E assim ele foi eleito mais em
função de sua bizarrice. O povo gosta de novidades e de qualquer coisa que o
divirta, que o faça esquecer por instantes as agruras da vida.
Logo ao ser nomeado governante, o
sujeito colocou em prática suas ideias. Instituiu a super Secretaria denominada
“Coordenação Central”, a quem todas as outras eram subordinadas. A primeira
medida da Coordenação Central foi a de instituir privilégios a todos que
aderissem ao novo governo. Bastava comparecer na repartição e preencher um
formulário com os seus dados pessoais e confessasse, sob responsabilidade civil
e criminal, que não era homossexual, não era fiel de religiões demoníacas,
nunca fizera ou incentivara abortos e não fumava. Se aprovado, tinha o direito
de usar uma braçadeira com uma cruz branca sob um fundo preto.
Os privilegiados não podiam ser
presos e nem multados por infrações no trânsito. E quando dois deles cruzassem
na rua ou em qualquer lugar deveriam dar uma saudação, esticando o braço
direito e gritando “Aleluia!”. De início, foi uma farra aquela gritaria de
Aleluia, mas, ao passar do tempo, a saudação passou a ser séria. O povo
gostava. Parecia fazer parte do governo, dos mandantes. Além de ser muito
divertido.
O eleito continuou com suas ações
inovadoras. Instituiu a “Gestão Popular”, que passou a ser conhecida pela
abreviatura GESTAPO. Esse órgão estimulava a chamada “Delação Premiada”. Todos
podiam comparecer na repartição e delatar amigos, desconhecidos, vizinhos ou
parentes de qualquer ato que contrariasse as regras governamentais. O delator
recebia um bônus para reduzir os seus tributos, ou, então, ganharia o valor em dinheiro.
Longas filas de delatores na
frente da GESTAPO. Os acusados eram trancafiados por medida cautelar até o
julgamento. Cabia a ele o ônus da prova em contrário da acusação delatada. Os policiais
da GESTAPO circulavam nas ruas, a invadir as casas dos suspeitos e agredir os
antipáticos. Respeitavam somente aqueles que usavam a braçadeira da Coordenação.
Mais um motivo para que todos
corressem à procura da adesão à super Secretaria.
E tudo foi assim até o dia em que
o povo, aos poucos, percebeu que a piada transformou-se em pesadelo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário