O renomado Professor Francisco Mangieri lançou recentemente
a sua obra “Administração Tributária Municipal – Eficiência e Inteligência
Fiscal”. Neste livro, Mangieri não teme em provocar os leitores com ideias
inovadoras para aplicação na administração fazendária, algumas de natureza tão
óbvia que chega a surpreender a necessidade de afirmá-las para que sejam lembradas
e adotadas.
Uma delas é a quebra da burocracia “burra”, a não confundir
a burocracia formal requerida nos atos administrativos com aqueloutras de exigências
abstrusas e absurdas, que não servem rigorosamente para nada, a não ser para
atormentar os contribuintes e encher de papéis inúteis as prateleiras das
repartições.
Outro dia, perdi uma licitação porque faltou na entrega do
imenso volume de papelório o “Demonstrativo do Índice de Liquidez Geral” da
empresa, demonstrativo que deveria ser assinado pelo Sócio e pelo Contador, ambos
com firma reconhecida, papel timbrado etc.. Argumentei: “Mas, meu amigo, o
Balanço foi apresentado, está aí. Basta dividir o Ativo Circulante pelo Passivo
que você terá o tal índice de liquidez geral”. O servidor – imagine – membro da
comissão de licitação, respondeu: “Olha! Eu nem sei para que serve esse índice
e não tenho a mínima ideia de como se calcula, mas faz parte das exigências e
não abro mão!”. A licitação era para ministrar um curso de dois dias, e, é
lógico, há sempre uma preocupação de a empresa quebrar antes de concluir
serviço de tão longa duração.
Mangieri prega o desmantelamento total desse jurássico ranço
burocrático que ainda infesta as repartições. Na verdade, o que ele deseja é
que o gestor dê uma parada na rotina e repense sobre a praticidade e utilidade
real dessa parafernália de obrigações. E não dizer que servidor público não tem
tempo para dar uma parada. Isso é balela. Tem tempo, sim, o que falta é
disposição e vontade de fazer. O que o autor destaca, daquele seu jeito polido
e educado de escrever, é que o gestor deixe de administrar só com os olhos no
retrovisor, como se os procedimentos utilizados no passado ainda se sustentam
nos tempos atuais.
Outro ponto crítico citado pelo professor é o circuito
processual, muito parecido com esses circuitos de corrida de carros, cheios de
voltas e curvas para chegarem ao mesmo ponto de partida. Meu Deus! Uma
via-crúcis, com todo o respeito. O processo administrativo passa por tanta
gente, a maioria apenas para despachar “prossiga”, ou “ao setor tal”, e cada processo
levando uma semana ou mais na mesa ou na gaveta do despachador. Por que não ir
direto a quem decide? Aliás, o status do servidor público se mede pelo número
de carimbos que dispõe. Servidor importante tem dezenas de carimbos em sua
mesa: “Encaminha-se”, “Arquive-se”, “Ao Protocolo”, “Para falar”,
“Notifique-se”, “Cientifique-se”, todos eles, assim, enfileiradinhos, em cima
da mesa, tudo arrumadinho, cada um com um esparadrapo em cima, dizendo o teor
do despacho que trata.
E os arquivos? Aquela montoeira de arquivos de aço abarrotados
de papel. Melhor dizer, de aço, não, de ferrugem. Arquivos sem alça,
desmantelados, tudo caindo aos pedaços. E guardando o quê? Papéis velhos,
sujos, rasgados, a maior parte sem qualquer utilidade ou serventia. Em tempos
remotos, um chefe novo do Cadastro Mobiliário perguntou para que servia uma
dezena de arquivos a ocupar enorme espaço. Disseram-lhe que aqueles arquivos
guardavam fichas de profissionais autônomos. Ali estavam os nomes dos
profissionais inscritos desde a inauguração do setor, uns quarenta anos atrás.
Para desespero dos funcionários antigos, o novo chefe mandou esvaziar os
arquivos e fez uma grande fogueira de São João no pátio da Prefeitura.
Nunca ninguém sentiu falta daqueles documentos.
Está na hora de os gestores públicos procurarem o oftalmologista.
A miopia pode ser genética, mas tem cura.
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