Ou
“já estou farto!”
Vivo no Brasil, aqui nasci e
sempre me ensinaram a amar o meu país. Mas, amor não correspondido aos poucos
se esvai e esgota nos bueiros da desilusão. Amor é sentimento de mão dupla e
amar a quem não retribui é mera estupidez.
Amei o meu país na infância,
juventude e maturidade. Persisti nesse amor com ingênuas aspirações de
reciprocidade e sempre sonhei com uma pátria dadivosa, a cuidar dos seus filhos
e demonstrar o seu afeto. E por este amor, lutei e apanhei nas ruas, reagi aos
desaforos dos estrangeiros, defendi o meu país com as garras da emoção. Tudo em
vão.
Somente agora, ao tempo das
reflexões, percebo o quanto fui enganado. Não posso dizer que fui traído,
porque, na verdade, o meu país nunca se importou comigo, nada me prometeu em
troca. Eu o amava, mas sem motivos racionais, como, aliás, são todos os amores.
Eu não me ufano do meu país,
ao contrário da declamação do Conde Afonso Celso. Os países são seres
imateriais, são os deuses das florestas, dos mares, da saúde e da fartura, os
deuses adorados no passado, mais pela superstição e ignorância dos povos. Não
vivo pela grandeza territorial do Brasil, vivo em uma cidade violenta, suja,
desprovida de serviços públicos e apinhada de ladrões e corruptos.
Vivo num país que não educa
o seu povo (apesar dos esforços dos professores, coitados); que não o atende
plenamente nos pleitos de assistência médica, que não lhe oferece transporte
decente, que não lhe garante segurança eficaz. Um país onde a energia elétrica
é cara e nem por isso nos deixa tranquilo com a certeza da fluência sem cortes
repentinos. O país dos sumidouros e das valas a céu aberto. Um país que nem
disfarça esconder o lixo debaixo do tapete, certamente por não ter tapete.
As florestas virgens a que
alude Afonso Celso já foram defloradas pela sanha predatória. As riquezas
naturais já estão saturadas. A baía do Rio de Janeiro transformou-se em esgoto. A
cachoeira de Paulo Afonso é hoje uma hidroelétrica. Onde estará o povo bom e
caridoso de Afonso Celso? O tal povo bom e caridoso é hoje desconfiado,
truculento, grosseiro e mal educado. E vive com medo, desajustado nas
desigualdades e nas injustiças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário