As Prefeituras dos Municípios brasileiros estão divididas em dois grandes segmentos: a) CAD (Com Advogados Disponíveis); e CAI (Com Advogados Indisponíveis). Seria possível abrir outro segmento, conforme testemunhos oititivos, falativos e intrigueiros, que seria o CAF – Com Advogados Fantasmas, mas vamos fazer de conta que este último segmento é pura fofoca a circular nos corredores sombrios do Paço Municipal.
Os Advogados dos Municípios CAD são obrigados a executar todas as certidões de dívida ativa que lhes são enviadas pela Secretaria Fazendária. E o Instrumentista do Setor de Dívida Ativa não quer saber: encaminha tudo que lá estiver, não importa o valor da dívida, o tributo, a infração e a autenticidade do débito. Coisas que não lhe diz respeito, pois o seu setor é uma fábrica de certidões, o negócio é produzir papel e despachar.
E o Instrumentista está certo! O Setor de Dívida Ativa é alvo constante da visitação retaliatória dos monges inquisitórios da Igreja Tribunal das Contas Sagradas do Penúltimo Dia Pentecostal, cujo fundamento teológico é de traduzir o idioma estranho das leis municipais. E repudiá-las! Temeroso dos flagelos horrendos aplicados pelos monges, o Instrumentista não pensa e nem pondera: produz certidões e despacha para os advogados.
E os advogados municipais acolhem os mananciais de certidões, qual um tsunami a invadir a procuradoria e afogá-los na inundação de papéis. E os advogados sabem que os monges certamente chegarão à procuradoria, com os seus mantos, cordões e livros sagrados, e irão devorar-lhes as entranhas se as certidões não seguirem o seu santo percurso. E fazem ingressar, aos borbotões, as ações de cobranças judiciais, livrando-se, assim, do entulho pecaminoso recebido.
E a carroceria da Justiça arria arfante diante do novo peso de processos jogados em suas costas. Os serventuários procuram distribuí-los pelos containeres das repartições, todos superlotados, muitos a sobrar no chão dos roedores e manter vivos os devoradores de papel.
Até um dia que a certidão chega às mãos do juiz. E daí em diante começa o ciclo das ações protelatórias, procedimentos formais e pomposos, contrarrazões, petições, liminares, agravos e desagravos. O juiz despacha em ritmo alucinante, a mão dói de tanto assinar, o carimbo se desgasta, o dia acaba rápido. O juiz já não examina o processo, páginas estratégicas são dobradas pelo auxiliar, ali está o essencial, o resto não importa. E o essencial é definido pelo auxiliar, não mais pelo assoberbado juiz.
E, finalmente, num luminoso dia, uma ação de R$50,00 transitou em julgado! Mas, ao mesmo tempo e ainda soterrado nos fundos do container, dorme em sono profundo uma certidão de dívida ativa no valor de R$1 milhão.
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