PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO
ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. ITBI. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL.
INADIMPLEMENTO POR PARTE DO DEVEDOR-FIDUCIANTE. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE
PLENA EM NOME DO CREDOR-FIDUCIÁRIO. IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO "INTER
VIVOS" DE BENS IMÓVEIS E DIREITOS A ELES RELATIVOS - ITBI. INCIDÊNCIA.
RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. A hipótese destes autos cinge-se em averiguar se é devido ou não o
recolhimento do ITBI por ocasião da consolidação da propriedade do imóvel em
nome do credor fiduciário nos casos de inadimplemento pelo devedor fiduciante.
2. Deveras, de acordo com o Código Tributário Nacional, o fato gerador
do ITBI ocorre com a transmissão onerosa, a qualquer título, da propriedade ou
do domínio útil de bens imóveis por natureza ou por acessão física, ou,
ademais, em face da transmissão onerosa de direitos reais sobre imóveis, exceto
os direitos reais de garantia, e, por fim, com a cessão de direitos relativos
às transmissões anteriormente mencionadas.
3. A questão jurídica posta neste apelo especial busca examinar a
incidência de ITBI na execução do contrato de alienação fiduciária em razão do
inadimplemento do devedor-fiduciante e consolidação da garantia real a favor do
credor-fiduciante.
4. Deveras, este contrato de direito real se materializa com o
registro do contrato fiduciário no Registro de Imóveis competente, cujo teor
confere ao credor-fiduciário a propriedade resolúvel do imóvel pactuado, com o
exercício da posse indireta desse bem, cabendo ao devedor-fiduciante, por sua
vez, a posse direta, exercendo-a através de uma condição negocial resolutória,
condicionado ao regular adimplemento das prestações pactuadas com o
credor-fiduciário, nos termos do artigo 23 da Lei n.º 9.514/1997.
5. O tratamento tributário quanto à incidência do ITBI no momento de
resolução da garantia firmada - como no caso em tela -, merece ser enfrentado.
Na hipótese de a dívida oriunda do contrato de alienação fiduciária vir a
vencer sem o adimplemento integral ou parcialmente do débito, o devedor
fiduciante será intimado a recolher o valor do débito e, caso não haja a
regularização desta dívida, a propriedade do imóvel oferecido em garantia será
consolidada em favor do credor fiduciário, nos termos do artigo 26, caput, da
Lei nº 9.514/1997. Como a hipótese referida ocasiona a desconstituição do
contrato real de garantia, de modo a consolidar a propriedade plena do imóvel
pactuado ao credor-fiduciário, retornará para este o domínio integral de todos
os poderes inerentes ao direito real sobre o bem imóvel (artigo 1.225, inciso
I, do Código Civil), caracterizando-se neste ínterim um ato de transmissão, a
qualquer título, de um domínio de propriedade, que por igual sentido,
acarretará a deflagração da hipótese de incidência do artigo 35, inciso I, do
CTN, validando-se outrossim, a determinação contida no artigo 26, § 7º, da Lei
n.º 9.514/97.
6. Recurso Especial não provido.
REsp 1844279 / DF - Rel. Min. Mauro Campbell Marques - DJ 05/05/2020.
Comentário do Consultor: Decisão
de grande importância para os Municípios. Como se sabe, realizada a compra e
venda com garantia da alienação fiduciária, o adquirente/devedor fiduciante
efetua o pagamento do ITBI, porque, ao adquirir a propriedade do bem, ocorre o
fato gerador do tributo. Porém, o registro em cartório da alienação fiduciária
em garantia, que é um direito real do credor, não constitui fato gerador do
imposto, como estabelece o inciso II do art. 156 da CF (“... e de direitos
reais sobre imóveis, exceto os de garantia”), pois, caso contrário, seriam duas
tributações ao mesmo tempo. Contudo, acaso o devedor fiduciante venha a se
tornar inadimplente com suas obrigações de pagar o financiamento do imóvel,
haverá a consolidação da propriedade resolúvel em nome do credor. Sobrevém,
assim, um novo fato gerador de ITBI, a exigir o seu pagamento no momento do
registro da propriedade em nome do credor.
Diz o Relator no seu voto:
A rigor, no fluxo habitual deste
negócio jurídico, o credor-fiduciante transmite a posse direta do bem ao
devedor-fiduciário, sob condição resolutiva, tendo como garantia a propriedade
do imóvel transferido. Nesta fase, não há incidência de ITBI na celebração do
contrato de financiamento, pois a propriedade do bem não foi transferida ao
devedor-fiduciante, mas tão somente a posse direta. Tal vedação, inclusive,
está expressamente disposta no art. 156, II da CF/88, art. 35, II, do CTN e
art. 278, II, da Lei Complementar nº 07/1997. Todavia, o tratamento tributário
quanto à incidência do ITBI no momento de resolução da garantia firmada – como
no caso em tela -, merece outro tratamento. Na hipótese de a dívida oriunda do
contrato de alienação fiduciária vir a vencer sem o adimplemento integral ou parcial
do débito, o devedor fiduciante será intimado a recolher o valor da dívida e,
caso não haja a regularização do pagamento, a propriedade do imóvel oferecido
em garantia será consolidada em favor do credor fiduciário (...). Como a
hipótese sobredita ocasiona a desconstituição do contrato real de garantia, de
modo a consolidar a propriedade plena do imóvel pactuado ao credor-fiduciário,
retornará para este o domínio integral de todos os poderes inerentes ao direito
real sobre o bem imóvel, inclusive a posse direta do bem (artigo 1.225, inciso
I, do Código Civil), caracterizando-se neste ínterim um ato de transmissão, a
qualquer título, de um domínio de propriedade, que por igual sentido,
acarretará a deflagração da hipótese de incidência do artigo 35, inciso I, do
CTN.
Temos certeza de que muitos Municípios estão deixando de cobrar o
imposto em tal situação.
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