Em remotas épocas, lá nos idos da década de 90, uma Prefeitura emitia o Alvará de Funcionamento, naquele modelo que parecia um diploma, colorido e muito bonito, com a seguinte mensagem no verso:
Em nome do Município, agradecemos a sua iniciativa de investir em um novo empreendimento econômico em nossa cidade e fazemos votos que ele se desenvolva e prospere.
Permita-nos lembrar alguns cuidados que deverão ser tomados em relação ao seu novo estabelecimento:
- procure mantê-lo sempre limpo e asseado, sem obstáculos nas passagens dos visitantes e clientes.
- cuide dos aspectos de segurança, cumprindo as normas expedidas pelo Corpo de Bombeiros, mantendo livres as saídas de emergência e os extintores na validade exigida;
- os banheiros devem estar sempre limpos e higiênicos, e os seus equipamentos funcionando!
- mantenha a calçada frontal ao estabelecimento limpa e não deposite a sujeira nas sarjetas;
- coloque o lixo em recipiente adequado e de acordo com as normas de limpeza pública; e o deposite para recolhimento no dia em que a coleta de lixo for executada em sua rua;
- qualquer obra de reforma do estabelecimento deve ser comunicada à Prefeitura, a não ser pequenas obras, tipo pintura, instalação de pequenos equipamentos, pequenos consertos elétricos ou hidráulicos. Obras que alterem ou provoquem mudanças no projeto, devem ser requeridas com a apresentação do novo projeto, assinado pelo engenheiro ou arquiteto responsável;
- se estiver em dúvida se pode ou não pode fazer alguma reforma no estabelecimento, o melhor caminho é consultar previamente a Prefeitura.
Evite o constrangimento de ser advertido ou autuado pela Fiscalização Municipal. Nós também não queremos que isso venha a ocorrer.
Desejamos-lhe muito sucesso!
O Prefeito
Tinha gente que dizia que a mensagem era politiqueira, mas, na verdade, não constava o nome do Prefeito e este modelo de Alvará passava por diversos mandatos eleitorais. A mensagem, porém, trazia uma responsabilidade para a própria Prefeitura: ter servidores aptos a receber os contribuintes, ouvir suas pretensões ou dúvidas e explicar, educadamente, o que seria ou não permitido, nos termos da legislação em vigor.
E ter servidores treinados e capacitados para exercer o atendimento é problema de gestão administrativa. Aliás, é comum gastar grandes recursos em locais de Atendimento ao Contribuinte e nada na capacitação e motivação dos servidores.
O Jornalista Carlos Alberto Sardenberg publicou artigo no Jornal O Globo, de 5/6/2014, sob o título “Quem quer empresas?”. Ele, de início, critica a legislação que em vez de incentivar a abertura de novos negócios, procura criar todas as dificuldades possíveis, algumas delas nas raias do absurdo.
Ele conta que um microempresário tentou abrir uma empresa de informática em São Paulo , num sobrado em bairro residencial. Não recebe clientes e todo o trabalho é on-line. No cardápio de exigências, havia laudo do corpo de bombeiros, projeto de engenheiro... e até a exigência de contrato de convênio de estacionamento! O microempresário gastou mais de R$3.000,00 só para conseguir os papéis exigidos.
Em outra história, o Jornalista conta a odisséia de um casal que exerce atividade de Artesanato há quinze anos. De repente, a Receita Federal resolve alterar o CNAE da firma, porque a atividade de artesanato tinha sido excluída do cadastro. O CNAE foi direcionado para o código mais próximo, batizando a firma com a atividade de “Agência Matrimonial”, coisa que nunca fizeram e não entendem patavina do assunto. A piorar, o local do estabelecimento, de acordo com a lei de zoneamento municipal, só permite indústria. E de artesanato deu um pulo para indústria, com o recheio de Agência Matrimonial. Foram obrigados a mudar de endereço.
Na Prefeitura, tiveram que responder um volumoso questionário com perguntas do tipo: Quantas árvores vão derrubar? Qual a área de manancial a destruir? Quantas toneladas de lixo industrial serão produzidas? E tudo isso para fabricar pequenos artefatos artesanais. O casal ainda tentou convencer um Fiscal para visitar a “empresa” e verificar o que faziam. O Fiscal recusou, dizendo que se fosse até lá teria de autuá-los porque a atividade era exercida de forma irregular.
Em minha opinião, acho que o casal devia desistir de trabalhar e inscrever-se no programa Bolsa Família. É mais fácil.
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