Ainda tenho esperança de um mundo melhor, um Brasil melhor, para o meu neto Heitor, para todos os meus netos, para todas as crianças. E que a natureza continue a frutificar, como o cajueiro do meu quintal.
segunda-feira, 30 de dezembro de 2013
sábado, 21 de dezembro de 2013
A questão do aumento do IPTU
Não pretendo discutir o caso isolado de São Paulo, mas de todos os Municípios que lidam com o problema de revisão do valor do IPTU.
Tudo gira em torno da definição da base de cálculo do referido imposto: a base de cálculo é o valor venal do imóvel. Valor venal é o valor de mercado do imóvel em condições normais de compra e venda. Se o mercado imobiliário fosse estável em todas as regiões de uma cidade, sem oscilações nas ofertas e nas procuras, bastaria encontrar um valor venal razoável e apenas atualizá-lo anualmente de acordo com os índices da inflação. A base de cálculo exigida na lei seria atendida por anos e anos.
Mas, em geral, o mercado imobiliário é dinâmico, ele pulsa de forma acelerada ou frenética em um grande número de cidades e, às vezes, para atrapalhar mais, um determinado bairro tem mais demanda do que em outro. Um pedaço da cidade cresce e acelera os preços dos seus imóveis, enquanto outro pedaço nada apresenta de evolução. Há, inclusive, algumas regiões urbanas que podem sofrer desvalorização repentina ou sistemática. A violência localizada é uma das causas de desvalorização dos imóveis lá existentes.
E manter os tais valores venais atualizados é uma das mais árduas tarefas dos técnicos da prefeitura. Em cidades pequeninas esta tarefa é mais fácil de ser executada. Estive certa vez em um micro município catarinense onde o chefe do setor imobiliário conhecia de cor e salteado o valor de todos os imóveis urbanos. Mas a cidade era uma rua cercada de montanhas por todos os lados. Assim é fácil.
Por isso, a maioria dos municípios usa uma espécie de planta ou mapa de valores genéricos por metro quadrado dos terrenos. No bairro A, o metro quadrado de terreno vale X reais; no bairro B, já vale Y reais, e assim por diante. Todavia, a localização do imóvel no bairro, a constituição do terreno, a tal pedologia, e a sua situação em relação à rua onde se situa, tudo pode implicar em valor maior ou menor que aquele padronizado no bairro. Por exemplo, um terreno alagadiço pode valer menos que um terreno sólido; um terreno de aclive pode valer menos que um terreno plano; um terreno de esquina pode valer mais que um terreno de única fachada. Mas, todas essas ponderações são feitas na base da intuição, porque nada prova na prática que um terreno de esquina, por exemplo, vale 20% mais do que um terreno com uma única frente. Aliás, muitas plantas genéricas de valores são elaboradas na mais alta técnica do chutômetro.
Depois vem o cálculo da edificação. Costuma-se distinguir as edificações da forma: Padrão A; Padrão B; Padrão C e vai por aí. Aplica-se, em geral, um percentual de depreciação do prédio em função do seu tempo de construção, como se uma edificação com vinte anos de existência valesse menos do que uma com cinco anos de construção. Achado o metro quadrado da edificação, de acordo com o padrão construtivo, multiplica-se pelo tamanho e, pronto, chega-se ao valor da construção.
Soma-se este com o valor do terreno e teremos a base de cálculo do IPTU. Mesmo sendo um valor razoavelmente chutado, o chute pode bater na trave ou passar rente ao gol da realidade do mercado. Na trave ou rente ao gol, o chute já é considerado muito bom e baseado nele o imposto é calculado e cobrado.
Ocorre, porém, que a esmagadora maioria das prefeituras estabelece esses parâmetros em determinada época ou momento, e assim fica por anos e anos, como se o mercado imobiliário sofresse de um repentino desmaio e estacionasse no tempo.
Poucos prefeitos gostam de atualizar a tal planta de valores genéricos, medida impopular porque, provavelmente, vai provocar o aumento do IPTU. E desta forma, a tal base de cálculo perde sua validade pelo andar do tempo. O chute já está mandando a bola na arquibancada. E aí, vem um prefeito e resolve atualizá-la e sai escrachado com fama de inimigo do povo. Mas, todo mundo esquece três aspectos importantes:
- os proprietários dos imóveis, incluindo as grandes empresas e os poderosos, ficaram anos e anos pagando valor menor do que deviam, aproveitando-se do descaso e da negligência dos prefeitos que não procuraram cumprir a lei e corrigir o valor do imposto, perdendo recursos que poderiam ter sido aplicados na melhoria dos serviços públicos;
- os prefeitos anteriores, que se omitiram e descumpriram a lei (valor venal é lei), não são denunciados pelo Ministério Público por improbidade e nem, tampouco, acusados pelo Tribunal de Contas. Como se sabe, erros de direito não retroagem e as diferenças antigas estão irremediavelmente perdidas;
- quando a revisão do valor venal não é feita por anos seguidos, o “aumento” provocado por uma nova revisão pode atingir valores demasiadamente elevados, e, por isso, a Justiça considerá-los de confisco, mandando retornar à base antiga. Ou seja, a evasão pode permanecer ad aeternum.
terça-feira, 10 de dezembro de 2013
A chamada “máfia do ISS”
O assunto continua a pleno vapor, principalmente por atacar os brios de São Paulo, a portentosa cidade do nosso País. Afinal, roubar tostões não dá ibope. Retorna-se, assim, ao tema.
Corrupção se combate com controles. Controles rígidos, de segurança máxima e indevassável. E controle eficaz é aquele que obriga aos servidores o cumprimento da lei. Que lei? No presente caso, a lei municipal, a lei do Município de São Paulo. Auditor Fiscal Municipal não é legislador, não é juiz, não pode interpretar a lei ao seu modo. Concorde ou não, o Auditor Fiscal é executor da lei municipal.
Pois bem, o Decreto Paulistano nº 53.151, de 17/05/2012, expressa essa preciosidade:
“Art. 32. É indispensável a exibição da documentação fiscal relativa à obra na expedição de "Habite-se" ou "Auto de Conclusão" e na conservação ou regularização de obras particulares.
Parágrafo Único - Os documentos de que trata este artigo não podem ser expedidos sem o pagamento do Imposto na base mínima dos preços fixados pela Secretaria Municipal de Finanças, em pauta que reflita os correntes na praça”.
Ou seja, a própria legislação dá margem às negociatas, as tramóias, à corrupção, pois estabelece uma exigência de absurda truculência. Estando a obra perfeitamente concluída, projeto obedecido, aprovada pela fiscalização de obras, o tal habite-se é direito do construtor e a existência de qualquer suspeita de débito tributário não pode impedir a liberação desta certidão. Isso é abuso de poder!
Por mais que se sabe, não se cansa de dizer: dívida tributária se cobra na Justiça! Não pode o Fisco usar da força bruta para receber seus créditos. E impedir a habitabilidade de um imóvel por estes meios é, sim, ato de constrangimento de direito.
Outro aspecto peculiar é a posição das empresas incorporadoras. Todo mundo sabe que incorporação imobiliária não gera ISS. Incorporação não presta serviços; vende imóveis. Contudo, sabe-se também que as incorporadoras são grandes tomadoras de serviços, geralmente de empreiteiras, e de acordo com a lei são responsáveis em reter o ISS quando efetuar o pagamento de tais serviços.
Todavia, mais uma vez a legislação municipal é confusa. O art. 31 do citado decreto diz assim:
Art. 31. Nos casos dos serviços descritos nos subitens 7.02, 7.04, 7.05, 7.15 e 7.19 da lista do "caput" do artigo 1º deste regulamento, considera-se receita bruta a remuneração do sujeito passivo pelos serviços:
I - de empreitada, deduzidas as parcelas correspondentes ao valor:
a) dos materiais incorporados ao imóvel, fornecidos pelo prestador de serviços;
b) das subempreitadas já tributadas pelo Imposto, exceto quando os serviços referentes às subempreitadas forem prestados por profissional autônomo;
Como se vê, a legislação paulistana permite deduções dos materiais aplicados na obra e das subempreitadas já tributadas pelo imposto. Essas deduções complicam os cálculos e exige uma série de ações fiscais junto aos contribuintes. E os contribuintes são as empreiteiras, não são as incorporadoras! A obrigação das incorporadoras é, enquanto tomadoras de serviços, de efetuar a retenção conforme lhes foi apresentada a conta pelo prestador. Não pode o Fisco atribuir-lhes responsabilidades de Fiscais do Município, se até mesmo perante o Fisco o levantamento do valor correto do imposto é trabalho extremamente complicado. Outra violência!
E mais ainda: a lei batiza de “solidário” na obrigação tributária os incorporadores. Ora, meu Deus! Somente aqueles que estão no mesmo polo da relação jurídica podem ser solidários. Por exemplo, dois prestadores de serviços; dois proprietários de um mesmo imóvel. Esses podem ser solidários, se a lei assim determinar. Mas nunca de pessoas em pólos antagônicos, tipo tomador e prestador de serviço, comprador e vendedor de um imóvel. Uma ilegalidade flagrante!
Por isso, causa espécie (causa espécie é ótimo) a posição dessas incorporadoras corruptoras. Ao serem coagidas, por que não ingressaram com pedido de liminar na Justiça? Por que não fizeram valer os seus direitos? Onde está o Jurídico dessas enormes empresas? Estranho, não é mesmo?
Corrupção se combate com controles. Controles rígidos, de segurança máxima e indevassável. E controle eficaz é aquele que obriga aos servidores o cumprimento da lei. Que lei? No presente caso, a lei municipal, a lei do Município de São Paulo. Auditor Fiscal Municipal não é legislador, não é juiz, não pode interpretar a lei ao seu modo. Concorde ou não, o Auditor Fiscal é executor da lei municipal.
Pois bem, o Decreto Paulistano nº 53.151, de 17/05/2012, expressa essa preciosidade:
“Art. 32. É indispensável a exibição da documentação fiscal relativa à obra na expedição de "Habite-se" ou "Auto de Conclusão" e na conservação ou regularização de obras particulares.
Parágrafo Único - Os documentos de que trata este artigo não podem ser expedidos sem o pagamento do Imposto na base mínima dos preços fixados pela Secretaria Municipal de Finanças, em pauta que reflita os correntes na praça”.
Ou seja, a própria legislação dá margem às negociatas, as tramóias, à corrupção, pois estabelece uma exigência de absurda truculência. Estando a obra perfeitamente concluída, projeto obedecido, aprovada pela fiscalização de obras, o tal habite-se é direito do construtor e a existência de qualquer suspeita de débito tributário não pode impedir a liberação desta certidão. Isso é abuso de poder!
Por mais que se sabe, não se cansa de dizer: dívida tributária se cobra na Justiça! Não pode o Fisco usar da força bruta para receber seus créditos. E impedir a habitabilidade de um imóvel por estes meios é, sim, ato de constrangimento de direito.
Outro aspecto peculiar é a posição das empresas incorporadoras. Todo mundo sabe que incorporação imobiliária não gera ISS. Incorporação não presta serviços; vende imóveis. Contudo, sabe-se também que as incorporadoras são grandes tomadoras de serviços, geralmente de empreiteiras, e de acordo com a lei são responsáveis em reter o ISS quando efetuar o pagamento de tais serviços.
Todavia, mais uma vez a legislação municipal é confusa. O art. 31 do citado decreto diz assim:
Art. 31. Nos casos dos serviços descritos nos subitens 7.02, 7.04, 7.05, 7.15 e 7.19 da lista do "caput" do artigo 1º deste regulamento, considera-se receita bruta a remuneração do sujeito passivo pelos serviços:
I - de empreitada, deduzidas as parcelas correspondentes ao valor:
a) dos materiais incorporados ao imóvel, fornecidos pelo prestador de serviços;
b) das subempreitadas já tributadas pelo Imposto, exceto quando os serviços referentes às subempreitadas forem prestados por profissional autônomo;
Como se vê, a legislação paulistana permite deduções dos materiais aplicados na obra e das subempreitadas já tributadas pelo imposto. Essas deduções complicam os cálculos e exige uma série de ações fiscais junto aos contribuintes. E os contribuintes são as empreiteiras, não são as incorporadoras! A obrigação das incorporadoras é, enquanto tomadoras de serviços, de efetuar a retenção conforme lhes foi apresentada a conta pelo prestador. Não pode o Fisco atribuir-lhes responsabilidades de Fiscais do Município, se até mesmo perante o Fisco o levantamento do valor correto do imposto é trabalho extremamente complicado. Outra violência!
E mais ainda: a lei batiza de “solidário” na obrigação tributária os incorporadores. Ora, meu Deus! Somente aqueles que estão no mesmo polo da relação jurídica podem ser solidários. Por exemplo, dois prestadores de serviços; dois proprietários de um mesmo imóvel. Esses podem ser solidários, se a lei assim determinar. Mas nunca de pessoas em pólos antagônicos, tipo tomador e prestador de serviço, comprador e vendedor de um imóvel. Uma ilegalidade flagrante!
Por isso, causa espécie (causa espécie é ótimo) a posição dessas incorporadoras corruptoras. Ao serem coagidas, por que não ingressaram com pedido de liminar na Justiça? Por que não fizeram valer os seus direitos? Onde está o Jurídico dessas enormes empresas? Estranho, não é mesmo?
terça-feira, 3 de dezembro de 2013
A televisão e o vizinho
Ao chegar de viagem recebi a notícia de que o nosso vizinho, do lado direito de quem vai, havia enlouquecido e encaminhado incontinenti ao manicômio sob camisa de força. Contaram-me que durante a janta, durante acalorada discussão dele com a televisão, remeteu um cinzeiro de pedra, bem pesado, contra a cara do âncora que transmitia as notícias sem esconder aquele sorrisinho idiota a mostrar seus dentes álveos e brilhantes, prenúncio da propaganda que vinha logo a seguir da kolinos, por certo aquele sorriso lhe renderia um cachê.
A vizinha, esposa do desvairado, já andava apreensiva com a saúde mental do marido, pois a mais ou menos um mês atrás ela confessara à minha mulher certas atitudes estranhas do indigitado cônjuge, como, por exemplo, a mania de discutir com a televisão.
“Ele não aceita as mentiras das notícias e começa a discutir com a televisão”, dizia ela. “O pior é que a televisão não responde, nada escuta, ela não tem a educação de interromper a programação para ouvir as ponderações e contestações do meu marido, e isso o deixa exasperado”. E continuou: “Fica o comentarista dando aquele boa noite e meu marido gritando para que ele continue na tela e enfrente o diálogo se for macho, mas que nada, o sujeito some e aparece logo uma mulher pelada tomando banho e dizendo que o sabonete Hólio é o melhor do mundo. Meu marido, irritado, muda o canal esperando encontrar alguém capaz que tope uma discussão”. E concluiu, tristonha, “isso acontece toda noite, coitado do Chicão” (Chicão é o marido)
Minha mulher, na época, tentou reanimá-la: “Por que você não procura conversar com ele. Certamente, seu Chicão está precisando de alguém para conversar”. Choramingando, ela respondeu: “Já tentei, mas ele diz que eu sou escrava da televisão, que ela me dominou, já fui subjugada, que eu já faço parte do enorme grupo de alienados. Ele diz que eu sou uma televisada, não sei bem o que isso significa, e tudo porque gosto de novelas, os programas do Faustinho, do Ratão, do Dudu Liberado, as pegadinhas, ah, adoro ver gente sendo enganada e levando tombo, como gosto também dos programas sérios, aqueles que fazem milagres e cura os doentes na nossa frente... Você assiste televisão, não é?” Minha mulher mudou de assunto.
No dia seguinte, de acordo com os preceitos sociais de boa vizinhança, fui ao manicômio visitar o meu vizinho, encontrando-o, que surpresa, bem disposto e falador, como de costume. Disse-me estar arrependido da agressão cometida, atirar um baita cinzeiro na cara da televisão, mas não resistiu quando o sujeito das notícias comentou que o desemprego estava caindo, o PIB está subindo, o serviço público está melhorando e a conta de luz vai baixar. “São vergonhosas mentiras, vizinho! Como pode alguém entrar na minha casa, dizer mentiras e desaparecer da tela, sem ouvir uma pronta contestação? Isso é um desaforo! Um visitante educado não pode agir assim!” .
Explicou-me que o motivo de ser isolado ao manicômio foi o fato de agredir a televisão, aparelho dos mais respeitados e idolatrados de uma casa, o juiz estava visivelmente ofendido. Se tivesse atingido a geladeira, o fogão ou o computador, a pena seria atenuada, praticamente irrelevante, engoliria um calmante, um suco de maracujá e tudo se resolvia. Mas, a beata televisão? Crime hediondo!
De qualquer forma, ele estava bem, a conversar com os malucos e receber respostas adequadas, como convém numa conversa. A única coisa que não lhe permitiam era assistir televisão no refeitório. Afinal, quando a televisão fala todo mundo se cala e ninguém lhe tira a razão, menos o Chicão.
A vizinha, esposa do desvairado, já andava apreensiva com a saúde mental do marido, pois a mais ou menos um mês atrás ela confessara à minha mulher certas atitudes estranhas do indigitado cônjuge, como, por exemplo, a mania de discutir com a televisão.
“Ele não aceita as mentiras das notícias e começa a discutir com a televisão”, dizia ela. “O pior é que a televisão não responde, nada escuta, ela não tem a educação de interromper a programação para ouvir as ponderações e contestações do meu marido, e isso o deixa exasperado”. E continuou: “Fica o comentarista dando aquele boa noite e meu marido gritando para que ele continue na tela e enfrente o diálogo se for macho, mas que nada, o sujeito some e aparece logo uma mulher pelada tomando banho e dizendo que o sabonete Hólio é o melhor do mundo. Meu marido, irritado, muda o canal esperando encontrar alguém capaz que tope uma discussão”. E concluiu, tristonha, “isso acontece toda noite, coitado do Chicão” (Chicão é o marido)
Minha mulher, na época, tentou reanimá-la: “Por que você não procura conversar com ele. Certamente, seu Chicão está precisando de alguém para conversar”. Choramingando, ela respondeu: “Já tentei, mas ele diz que eu sou escrava da televisão, que ela me dominou, já fui subjugada, que eu já faço parte do enorme grupo de alienados. Ele diz que eu sou uma televisada, não sei bem o que isso significa, e tudo porque gosto de novelas, os programas do Faustinho, do Ratão, do Dudu Liberado, as pegadinhas, ah, adoro ver gente sendo enganada e levando tombo, como gosto também dos programas sérios, aqueles que fazem milagres e cura os doentes na nossa frente... Você assiste televisão, não é?” Minha mulher mudou de assunto.
No dia seguinte, de acordo com os preceitos sociais de boa vizinhança, fui ao manicômio visitar o meu vizinho, encontrando-o, que surpresa, bem disposto e falador, como de costume. Disse-me estar arrependido da agressão cometida, atirar um baita cinzeiro na cara da televisão, mas não resistiu quando o sujeito das notícias comentou que o desemprego estava caindo, o PIB está subindo, o serviço público está melhorando e a conta de luz vai baixar. “São vergonhosas mentiras, vizinho! Como pode alguém entrar na minha casa, dizer mentiras e desaparecer da tela, sem ouvir uma pronta contestação? Isso é um desaforo! Um visitante educado não pode agir assim!” .
Explicou-me que o motivo de ser isolado ao manicômio foi o fato de agredir a televisão, aparelho dos mais respeitados e idolatrados de uma casa, o juiz estava visivelmente ofendido. Se tivesse atingido a geladeira, o fogão ou o computador, a pena seria atenuada, praticamente irrelevante, engoliria um calmante, um suco de maracujá e tudo se resolvia. Mas, a beata televisão? Crime hediondo!
De qualquer forma, ele estava bem, a conversar com os malucos e receber respostas adequadas, como convém numa conversa. A única coisa que não lhe permitiam era assistir televisão no refeitório. Afinal, quando a televisão fala todo mundo se cala e ninguém lhe tira a razão, menos o Chicão.
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