Teotevaldo Marilomba, insigne fazendeiro do Município de Santo Onofre do Cupinzeiro, tido e havido como doutor nas artes belicistas e magnífico feitor de mortes mandadas, veio a saber que a praça da cidade situava-se em área sem registro cartorial, considerada pública e inalienável.
Nada tendo a ver com essas questões legislativas, das quais nunca participou ou, pelo menos, nem convidado a tecer suas sempre razoáveis opiniões, além do fato de que ele tem coisas mais importantes a fazer do que ficar de conversa fiada em recintos parlamentares, resolveu, por sua conta e direito, assumir a propriedade da praça e colocar no papel o seu nome de proprietário.
Compareceu de imprevisto no cartório da cidade, e devidamente assessorado por três causídicos fortemente armados, determinou ao apalermado tabelião passar ao livro o registro usucapiado da propriedade e todas aquelas exigências burocráticas de matrículas e averbações.
Ato contínuo, cercou a praça com tapumes e escreveu em cima: “nova direção”. A população, sem mais onde andar, jogar damas e dormir nos bancos, reclamou ao prefeito o inusitado domínio, mas o prefeito, temente aos desígnios de Teotevaldo Marilomba, e não interessado a abrir querelas com o poderoso fazendeiro, fez ouvidos moucos e deixou de lado os reclamos dos indignados moradores.
O promotor do local foi avisado e, a bem da verdade, ainda tentou organizar processo incriminatório, logo paralisado e de trânsito bloqueado, quando a assessoria do fazendeiro resolveu transformar a casa do promotor em alvo de disparos de fogo. O representante do ministério público logo se lembrou de uma licença prêmio não gozada, e partiu para a capital, carregando família, móveis e utensílios.
Santo Onofre do Cupinzeiro ficou sem praça, mas o povo foi se acostumando e até gostando das promessas de Teotevaldo Marilomba que ali construiria um tal de shopping, parecido com aqueles da capital, com um monte de lojas e diversas praças de alimentação, uma coisa de primeiro mundo, e muito mais importante que a antiga pracinha, lugar de aposentados vagabundos, dormitório de mendigos e de namoricos dessa juventude transviada.
Sem esquecer sua fé religiosa, pois dizem que Teotevaldo era capaz de rezar o Salve Rainha de corridinho, bastava dar um arranque no início, fez levar em procissão a imagem de Santo Onofre, anteriormente instalada na praça, até a catedral da cidade, o que deixou satisfeito o vigário e mais satisfeitos ainda os evangélicos, que se incomodavam com a presença da imagem na praça, lugar comprobatório do espírito laico do governo local.
E assim tudo correu bem, o povo já acostumado e esquecido do que era antes, mas, agora, Teotevaldo Marilomba está de olho na avenida principal, e todos curiosos em saber qual será o empreendimento a ser construído no lugar da avenida.
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