segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Manicômio Fiscal XXVI

Cenário: Sala do Chefe do IPTU. Personagens: o Chefe do IPTU e um contribuinte que tem o costume de conversar não olhando diretamente a pessoa.
Sobe o pano.

Chefe – Bom dia, pode sentar-se... O senhor queria falar comigo?
Contribuinte (olhando para a cortina de alumínio na janela) - O meu IPTU veio muito alto...
Chefe – O valor subiu muito em relação ao ano passado?
Contribuinte (falando para um cinzeiro de vidro cheio de clipes) - Quase 50% de aumento...
Chefe – O senhor trouxe os carnês?
Contribuinte (falando para o quadro com a foto do Prefeito) - Estão aqui... Pode ver...
Chefe (examinando os carnês) – Mas... Espera aí... Os carnês são de imóveis diferentes...
Contribuinte (conversando com a lixeira) - É que eu mudei de casa...
Chefe – Se o senhor mudou de casa, o IPTU vai ser diferente... É lógico!
Contribuinte (dirigindo-se ao ventilador de teto quebrado) - Acho que isso não importa, o contribuinte é o mesmo... Sou eu...
Chefe – Claro que importa! O senhor trocou de casa e agora está morando num imóvel de maior valor... Veja aqui o valor venal de cada um!
Contribuinte (falando com uma mosca que insistia em pousar no seu joelho) - Mas o valor do imposto não tem que ter relação com a capacidade contributiva de quem paga? Eu andei lendo... A minha capacidade não aumentou 50% de um ano para o outro.
Chefe – Meu amigo, a capacidade contributiva é medida pelo valor do imóvel que o senhor possui. Se o senhor tem uma casa de valor maior, certamente a sua capacidade contributiva é proporcional ao valor da casa atual.
Contribuinte (olhando para um monte de processos na mesa do Chefe) - No meu caso não... Esta casa eu herdei da minha mãe, que faleceu. Então, a minha capacidade contributiva não tem nada com o valor da casa. Eu trouxe aqui os meus contracheques do ano passado e deste ano... Pode ver. O meu salário não aumentou.
Chefe - Não vem ao caso. O IPTU é um imposto real, que recai sobre o bem imóvel...
Contribuinte (falando com a ponta do seu sapato) - Mas quem paga sou eu, a pessoa... A casa não paga nada... Eu até pedi a ela para pagar o imposto... Ela não responde, a casa é mais surda que a porta, dela.
Chefe – Olha, o senhor agora está ironizando e não pretendo entrar numa discussão acadêmica ou de gozação com o senhor.
Contribuinte (conversando de novo com o cinzeiro) - Eu não estou ironizando, foi o senhor que falou que o imposto é da casa, não é meu.
Chefe – Bem, se o senhor não concordar com o que estou falando, pode entrar com impugnação, ou até mesmo pela Justiça.
Contribuinte (ainda falando para o cinzeiro) – Eu faço a impugnação em meu nome ou no nome da casa?
Chefe (já impaciente) – Faz em seu nome! Casa não tem nome!!
Contribuinte (com a atenção voltada para a mosca) – O senhor se engana, esta casa tem uma placa na frente, dizendo “Lar da Família”... Foi a minha mãe que batizou a casa, há muitos anos, e todo mundo a conhece por esse nome, lar da família.
Chefe (um tanto irritado) – Não importa se a casa tem um nome fantasia, o que importa é o proprietário dela!
Contribuinte (dirigindo-se ao quadro do Prefeito) – E não tendo o proprietário, que sou eu, condições de pagar o IPTU, como se resolve o problema?
Chefe – Ora! Não sei! Aluga a casa, vende a casa!
Contribuinte (olhando os processos) – Então, para pagar o imposto tenho que vender a casa?
Chefe – É uma hipótese!
Contribuinte (levantando-se e falando para a janela) – Está certo, mas tenho que arranjar um comprador que tenha capacidade contributiva, não é assim?
Desce o pano.

Nenhum comentário:

Postar um comentário