Cenário: sala de um dos assessores do Chefe de Gabinete do Secretário-Geral de um Ministério. Personagens: Assessor e um Prefeito.
Sobe o pano.
Prefeito – Boa tarde, senhor assessor! Eu marquei essa entrevista há oito meses atrás e recebi ontem o recado que o senhor podia me atender hoje.
Assessor – Sente-se, por favor. O senhor é Prefeito de qual Município... pra eu anotar aqui...
Prefeito – Sou Prefeito de Muriçoca do Brejo, lá das Minas Gerais.
Assessor (digitando no computador) – Ah, perfeito... está anotado... em que posso servi-lo?
Prefeito – Estou precisando de uma verbinha, coisa à toa, pra ajudar em alguns serviços públicos. Andei analisando o IDH da minha terra e vi que o índice ainda é baixo em serviços públicos, tipo arruamento, limpeza pública, essas coisas...
Assessor – Nós temos vários tipos de verbas, mas todas elas visam o crescimento econômico do Município. Muriçoca do Brejo tem potencial econômico?
Prefeito (coçando o queixo) – Bem... é claro que tem! Nós temos leite, fazemos manteiga, queijo...
Assessor – Tem grandes indústrias? Uma grande cooperativa de leite?
Prefeito – Bem... isso não temos não senhor, mas, quem sabe, um dia...
Assessor – Qual é a população do seu Município?
Prefeito – Bom... mais ou menos uns cinco mil habitantes...
Assessor – Cinco mil? Muito pouco, muito pouco... Se tivesse uma indústria, muita chaminé, nós temos verba para combater a poluição...
Prefeito – É, mas poluição não tem não senhor... eu preciso de um dinheirinho pra melhorar o IDH...
Assessor – A sua cidade já tem problemas com tráfico de drogas, maconha, cocaína, crack... temos verba pra ajudar os drogados...
Prefeito – Esse tipo de coisa não tem não senhor... tem uns pinguços, tem fumantes de cigarro de palha...
Assessor – Pra isso não temos verbas... Tem muito assalto a mão armada? Tem verba pra ajudar na segurança pública...
Prefeito – Certa vez, anos atrás, um caseiro roubou o patrão com uma foice na mão... isso serve?
Assessor – Não, foice não... tem que ser arma de fogo... tem muito acidente de atropelamento? Temos verba para ordenar o trânsito...
Prefeito – Outro dia uma carroça de boi quase atropela o meu vice... ele também está velhinho e enxerga pouco, coitado.
Assessor – Assim está difícil... o senhor precisa estimular o desenvolvimento econômico do Município.
Prefeito – Pra quê?
Assessor – Pra depois a gente entrar com dinheiro para combater os males do desenvolvimento, entendeu?
Prefeito – Mais ou menos... o senhor, então, não tem um dinheirinho pra ajudar nos serviços públicos?
Assessor – Bem, é difícil... de quanto o senhor precisa?
Prefeito – Ah, uns cem contos resolve...
Assessor – Cem mil reais? Ora, Prefeito, aqui só trabalhamos com verba acima de um milhão!
Prefeito – Um milhão? O que vou fazer com tanto dinheiro?
Assessor – O senhor por acaso já fez um projeto para obter uma verba?
Prefeito – Projeto? Não senhor.
Assessor – Pois é! O senhor vai ter que contratar uma firma de consultoria, advogados, despachantes, um escritório de representação aqui em Brasília, talvez uma ONG pra tocar o projeto... quanto o senhor pensa que vai sobrar num projeto de um milhão?
Prefeito – Uns cem contos?
Assessor – Por aí, talvez menos, talvez menos...
Desce o pano.
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